Especialista em Medicina Intensiva
Assistente Graduada de Pneumologia
HPA Magazine 17
As sequelas pós-COVID-19 são conhecidas por uma variedade de nomes (incluindo COVID longo ou síndrome pós-COVID-19), desde setembro de 2020 estão incluídas na classificação internacional de doenças da Organização Mundial de Saúde (WHO ICD-10) como “post-COVID-19 condition”. Esta inclusão foi de extrema importância uma vez que dá resposta legal ao sofrimento de milhões de indivíduos, justificando o seu absentismo laboral e reconhece estes sintomas pós-COVID-19 como uma doença. Em dezembro de 2021 foi publicada na revista “The Lancet Infection” a definição de consenso da Organização Mundial de Saúde desta síndrome pós-COVID-19: “Doença que ocorre em indivíduos com um histórico de infeção SARS-CoV-2 provável ou confirmada, geralmente 3 meses a partir do início da COVID-19 com sintomas que duram pelo menos 2 meses e não podem ser explicados por um diagnóstico alternativo. Os sintomas podem ser novos após a recuperação inicial de um episódio agudo da COVID-19 ou persistir da doença inicial. Os sintomas também podem flutuar ou recaír ao longo do tempo. Não é necessário apresentar todos os sintomas.”
A presença de fadiga persistente é o sintoma mais frequente, sendo o sintoma mais complexo de quantificar e tratar. Na avaliação clínica inicialmente realizo uma avaliação respiratória, cardíaca e endócrina (a infeção a COVID-19 pode provocar alterações da tiroide), coordenando com a reabilitação funcional através da fisioterapia personalizada. Para quantificar a fadiga o instrumento de avaliação usado na consulta é a escala de fadiga de Chalder que permite a avaliação dos dois domínios da fadiga: físico e psicológico.
Também são avaliadas a alterações do sono, especialmente respiratórias (potencialmente tratáveis), uma vez que existe justificação fisiológica para a síndrome de apneia obstrutiva do sono (SAOS) ser uma potencial causa da fadiga pos-COVID-19, pois desencadeia diminuição noturna intermitente do oxigénio, inflamação sistémica, stress oxidativo, aumento da pressão arterial e disfunção cardíaca. A SAOS também ativa o mesmo recetor de entrada para SARS-CoV-2 nas células.
Estes doentes também apresentam alterações psicopatológicas frequentes como o desenvolvimento de sintomas de stress pós-traumático, ansiedade e depressão, relacionados com a pressão psicológica gerada pelo isolamento, “medo de morrer” e impotência perante a infeção e eventual gravidade da doença. Na consulta é realizada a escala padronizada HADS (escala de ansiedade e depressão hospitalar) para um rastreio inicial, sendo os doentes com níveis elevados encaminhados para a especialidade adequada.
Estas sequelas observadas após infeção a SARS-CoV-2 já foram descritas com outros vírus no passado, mas a dimensão da pandemia exponencia a quantidade de indivíduos que podem vir a sofrer destes sintomas, tornando-se urgente a nossa coordenação como profissionais de saúde para dar resposta a esta nova fase tardia da pandemia.